sexta-feira, 3 de maio de 2013

Pensar Nove Décadas de Amizade (nº 10): Lélia Parreira Duarte*

Eduardo Lourenço e os professores brasileiros
de Literatura Portuguesa Maria Aparecida Santilli, Lélia P. Duarte e Vilson Meller (1987)



Conheci Eduardo Lourenço na década de 70. Além do ensinamento constante dos seus livros, desde então devo-lhe muitas gentilezas: quantas vezes foi ouvir-me, nos encontros de Literatura Portuguesa, sempre com um comentário amável, uma sugestão, um incentivo. Vi-o e ouvi-o em muitos cursos e congressos, sempre admirando a sua elegância e aprendendo com sua reflexão profunda e com sua incrível cultura e capacidade de comunicação. Muito receptivo e disponível, ele nos trouxe a Belo Horizonte, várias vezes, o seu carisma e a sua sabedoria. Uma vez ficou mais evidente o seu constante aprendizado: num curso com que nos brindava, na UFMG, e numa das aulas em que falava sobre Garrett e o cristismo, parecia estar em transe: percebia-se a sua boca seca, o seu cansaço, depois de três horas de aula. Coloquei-lhe à frente um copo de água, mas ele não o tocou, sequer o viu! Essa a sua capacidade de concentração e reflexão, como se exemplificasse o dito de Guimarães Rosa: “Mestre não é quem ensina, mas quem de repente aprende!”

Que possamos por muitos anos vê-lo com saúde e boa disposição para nos trazer as suas lições, de que lembro uma pequena pérola, para terminar (J.L., 07/10/2008): «A poesia – quer dizer a longa trama dos poemas onde a humanidade a si mesma se construiu, a única arca de Noé que sobrevive a todos os dilúvios – não é a nossa maneira de nos evadirmos do que somos mas de nos apercebermos, embora em figura, como dizia São Paulo, de quem verdadeiramente somos. É uma barca de palavras, mas tem o poder de transfigurar o que é opaco e não humano naquela realidade que tem um sol no meio e chamamos vida, a nossa vida, a nossa única vida».

*Lélia Parreira Duarte, Professora Aposentada da Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil.
Texto inédito gentilmente enviado pela Autora para Ler Eduardo Lourenço.